sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Combustíveis fósseis: os vilões da matriz energética mundial? Parte II

Em um post anterior, foi feito um breve apanhado a respeito de em que consistem os combustíveis fósseis, como se formam, e porque são chamados de fontes "não renováveis" de energia.
Uma vez que há uma série de questionamentos ambientais e éticos, além de aspectos técnicos que apontam para a insustentabilidade do uso desenfreado destas fontes, por que os combustíveis fósseis ainda respondem por mais de 80% da matriz energética mundial? Analisar alguns dados pode ser esclarecedor.
É senso comum que as reservas de petróleo estejam prestes a acabar no futuro próximo. Embora seja evidente, pelo considerado no post anterior, que as reservas totais de combustível fóssil sem dúvida estejam sendo reduzidas, o fato é que não se sabe ao certo quanto ainda resta no subsolo. De fato, ainda hoje, o volume anual de novas jazidas de petróleo encontradas supera a extração e consumo anual do petróleo. Veja o gráfico abaixo (fonte: International Energy Agency - IEA)
Segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP), as reservas mundiais de petróleo comprovadas aumentaram 0,1% em 2009 em relação a 2008, e as de gás natural, 1,2%.
Estes dados, surpreendentes para muitos, indicam que a situação de falta de combustível fóssil não é tão iminente quanto alguns veículos de mídia podem fazer crer.
Outro indício de que os combustíveis fósseis ainda estarão fortemente presentes na matriz energética nas próximas décadas é o volume de recursos empregado na pesquisa e desenvolvimento relacionadas a eles. Como exemplo, os dados estatísticos relacionados a P&D de energia somente nos Estados Unidos, revelam um investimento de US$ 166 milhões em pesquisas relacionadas a combustíveis fósseis, ao passo que apenas US$ 102 milhões em energias renováveis. Apesar disso, os Estados Unidos é um dos países que mais investem em pesquisa de fontes renováveis de energia. Por isso, algumas fontes falam em volumes mundiais de investimentos 10 vezes maiores em pesquisa e desenvolvimento relacionados a combustíveis fósseis, comparados àqueles relacionados a fontes renováveis de energia.
Por esta razão, estes combustíveis são responsáveis pela maior parte da geração de outras formas de energia, como a gereação de energia elétrica. Segundo a Aneel, mais de 39% da energia elétrica mundial é gerada a partir de carvão mineral, devido a eficiência, baixo custo e estabilidade de preços.
De um ponto de vista regional, os aspectos econômicos também são determinantes para a larga utilização de combustível fóssil. O Rio Grande do Sul, por exemplo, possui 88% das jazidas de carvão comprovadas do Brasil (fonte: SEPLAG RS). Isto o torna o principal bem mineral do estado. Sem dúvida há portanto o interesse político e econômico na manutenção de seu uso para os mais diversos fins.
Um aspecto tecnológico muito importante a favor do emprego de combustíveis fósseis é o "estado da arte" em que se encontra o desenvolvimento da tecnologia disponível para o emprego destas fontes. Sites de fornecedores de tecnologia, como Siemens e GE, utilizam argumentos como a confiabilidade e eficiência dos processos envolvendo combustíveis fósseis, o que implica também em economia de custos e maximização de lucros.
Portanto: a) a relativa abundância de recursos remanescentes; b) o volume de investimentos que foram (e continuam sendo) aportados nestas fontes; c) o estado de desenvolvimento e consolidação da tecnologia relacionada a elas; e d) os interesses políticos e econômicos são algumas das principais razões pelas quais os combustíveis fósseis respondem por mais de 80% da matriz energética mundial.
No entanto, que dizer dos aspectos ambientais? que alternativas existem para um uso mais racional das fontes não renováveis de energia? Estes serão assuntos para o terceiro e último post da série.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Combustíveis fósseis: os vilões da matriz energética mundial? Parte I

Sem dúvida o assunto de combustíveis fósseis é um tema de ampla abrangência e complexidade, sobre o qual muitos enfoques podem ser dados. Neste post serão abordados apenas alguns pontos, para incentivar o leitor a reflexão e (talvez) revisão de alguns conceitos.
O combustível denominado "fóssil" pode ser definido como um "depósito de hidrocarbonetos, como petróleo, carvão mineral e gás natural, derivado dos restos (fósseis) acumulados de antigas plantas e animais, utilizado como combustível".(The American Heritage Science Dictionary).
Esta definição é um pouco simplista no que tange ao modo como se formam estas substâncias. Na verdade, a mera deposição ou acúmulo de restos de plantas e animais não produz em si petróleo, carvão mineral ou gás natural. Ao menos não na forma em que são empregados como recursos energéticos. A verdade é que as condições a que estes resíduos são submetidos (temperatura, pressão, pH, tempo de residência, agentes catalíticos, etc) lhes conferem suas características peculiares. E é também por isso que há diferentes composições de petróleo, carvão mineral e gás natural, de acordo com as condições a que estavam submetidos nos diferentes locais onde se encontravam.
Em realidade, o termo "combustível" é limitado para descrever este amplo conjunto de compostos orgânicos, cujo ponto em comum é sua origem. O petróleo, por exemplo, é matéria prima na fabricação de plásticos, borrachas sintéticas, solventes e uma série de outros produtos que se destinam a fins diversos que não a combustão. O carvão mineral, por outro lado, é muitas vezes utilizado sob a forma de coque para a têmpera do aço industrial, conferindo-lhe características mecânicas e fisico-químicas peculiares. E até mesmo o gás natural, composto consideravelmente mais simples, é utilzado em algumas aplicações como matéria prima.
Por que se diz que estes combustíveis fósseis são recursos finitos, ou esgotáveis? Afinal, o processo de crescimento, morte e decomposição animal e vegetal, bem como a sedimentação e deposição destes resíduos no subsolo - que gerariam as condições de produção dos combustíveis fósseis - são processos contínuos!
A questão pode ser respondida com um balanço material global.
De fato, os combustíveis fósseis são chamados de "fontes não renováveis de energia", e seu ciclo, de "ciclo aberto", porque a taxa de produção destas substâncias - e por "produção" entenda-se sua formação no subsolo - é de uma ordem de grandeza incomparavelmente inferior a taxa de extração e consumo. Enquanto as "energias renováveis" de "ciclo fechado", como biocombustíveis, possuem um tempo de reposição da ordem de meses, os ciclos completos do carbono de origem fóssil seriam fechados após séculos. (Veja o site breve história do petróleo, do prof. Luís Carlos Gomes Domingos, do Departamento de Mineralogia e Geologia da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra).
Aliado a isso, há evidências que a quantidade relativamente grande de reservas destas substâncias que existem na época atual, se deve a alguns eventos extraordinários que ocorreram em eras geológicas passadas, fazendo com que grandes quantidades de "matéria prima" para os combustíveis fósseis - restos de animais e vegetais - fossem soterrados e sedimentados quase simultaneamente. Ou seja, a taxa média de produção destes materiais seria ainda menor que aquela que produziu as reservas das quais hoje o homem beneficia-se.
Portanto, por que os combustíveis fósseis respondem ainda por mais de 80% da matriz energética mundial? (Fonte: IEA - International Energy Agency). Este será um assunto para um post futuro.